quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

Lua, nua, rua.

Madrugada. Cerração de portas. De bares. De ares. Neblina espessa de desejos.
Praça. Árvores.
Bancos, três.
Lua, nua, rua.
Pulsante nos corredores
correndo dos pudores, fugindo para os pudendos sem poder. Porque somos comprometidos com o limite, com a vergonha, insinuada pelos cala-frios. Cale, frio.Calou.
Calor, suor.
Suas?
- Não. Não somos suas.
- Sei, vocês são suas.
Sei-o pueril e sazonado ao mesmo tempo.
Tempo!
Seis horas.
e a lua ainda não finda.
A rua,
ainda peleja por arrastar novas horas e desrespeitar sinais.
Porque hoje e, só hoje, nuas de receio e egoísmo, despertaremos libidos proibidos.
Lua, nua, rua.

sábado, 22 de novembro de 2008

Brotou
Rubro
Em teu cabelo,
cresceu mulher
em tua cabeça
amadureceu,
eu , você
e agora somos jovens e distantes.
Mas nunca sozinhas no caminho,
onde até as pedras são companheiras de viagem.


[Para a moça que embarcou no Atlântico rumo à metrópole - Portugal - e deixou saudades na colônia inteira de amigos.]

sábado, 8 de novembro de 2008

'Fingir, na hora, rir'

Você me espreita, eu sei.
Nas suas asas de gigante Homem
E finge que despreza a inerente,
Impregnada, ignorada
Alma no seu espaldar.

Passo o punho,
Dedilho devagar por sua exausta coluna
E você divaga os olhares
Afim de não compreender,
Ou parecer.

Finge que não me percebe.
Mas estou aqui.
Sobreposta em seu corpo hirto
Por sentimentos sem definição,
Quase apodrecidos.
Adubam-se, regam-se por natureza.
E se eternizam em chamas involáteis
e sorrisos perdidos.

segunda-feira, 3 de novembro de 2008

Nem pior nem melhor
"nem isso nem aquilo"
É tristeza fingida de cansaço
Vou-me embora, agora.
Assolar no travesseiro
Essa dor que me afoga,
Por não ter quem a afague.
Essa dor da cor, do cheiro
Da flor-última que me destes
Nos tempos da indelicadeza
Matizados de vermelho-claro-e rosa,
- hoje quase desbotados -,
A não ser pelos temperos
(às vezes ásperos)
Que as conservam
Em cores vivas
(às vezes lacrimejante)
Suavemente amalgamados em perfumes
De odores passados, nostálgicos.
Dos passados vividos e não.
Dos futuros sonhados e realizáveis.
Do presente – a flor-última que me tiras
E que esmaga no terreno infértil, não adubado,
Que dirá regado de águas destiladas,
Sinceras,
Pura.

segunda-feira, 27 de outubro de 2008

o anti-social, ou anti-superficial.

Esse menino de vermelho precisa de invólucro.
Sentado, os pés hiperativos fazem batuque no assoalho, as mãos, à procura de distração tomam a taça sobre a mesa. Bebe, bebe com uma sede breve e melancólica. Seus olhos fugidios não encontram alguém que possa ser de sua família. Como é possível? Se na mesma mesa, seu pai e sua mãe tagarelam, e sua irmã, de um cabelo liso tão semelhante ao seu, come com classe um salgadinho, fechando o círculo dos superficiais?
Esse menino, de traje impróprio e inseguro, que se sente tão diferente dos outros, precisa ser ouvido. Ele precisa de alguém que lhe dê atenção, que lhe dê abraço.
O que ele não sabe, é que quando se sentir protegido, vai clamar por liberdade.

quarta-feira, 15 de outubro de 2008

Chronos

Meus pensamentos turvos se opõem à razão que você tanto busca me impor.
O gosto dos seus conselhos tem efeito anuviante, deixando-me cinza e efusiva.
Não gosto.
O tamanho da minha arrogância nisso ainda é menor que a sua prepotência.
Não me chamo mais Menina. Respeite o tempo.

segunda-feira, 6 de outubro de 2008

Depois do casulo.

Tenta recordar, ele, ela, juntos. Um surto de vaidade o fez olhar no espelho mais atentamente. Novos contornos, espessuras, superfície antes lisa e branda, agora brotava rosa de broto amarelo. O refletor que cobria dos pés aos cabelos, reflete agora somente aquilo que lhe é simbólico. Ela não cabe mais dentro dele. A perfeita simbiose se desfaz, ficando apenas os estilhaços em fotos recortadas e recordadas. O apoptose dos sentidos foi brusco, por pouco ele não se adaptou à voz estremecida, indecisa, que por fim afinou-se. Rouca, com insinuações maduras. Ela, arredondada como uma pêra, deixou de lado o Tesouro da Juventude, o pique, o carrinho e a boneca. Era hora de aprender a lidar com o vermelho. Vermelho em dois tons, um físico, outro afetivo. O espelho apontava nela o significativo dos traços rugosos. O ferrugem nele ferro fazia se sentir sólido estático. Eles fecham os olhos com medo dessa janela - espelhar, medo medo medo, covardes são. Mas quem aceita de bom grado mudanças? Quem se arrisca a sair eternamente do casulo metamórfico, e não ser mais você, ele ou ela, ambos? Imagem fragmentada mostra a escamação pubiana, escamoteados pela timidez. Casca seca, rachaduras; é preciso trocar de roupa.

quarta-feira, 17 de setembro de 2008

Conversa de sado-masoquistas

-... Pois é, Juma, hoje eu disse para o Vassalo que o amava.
- Como assim, Susserana? Ontem mesmo você me disse que pensava em terminar o namoro, pois não conseguia gostar dele.
- Então... Pensei bem e percebi que esse amor de subserviência do Vá me trará vantagens. Um mal necessário, sabe?
- Nossa! ...mas você acha certo, Su, sustentar um amor por mentira?
- Ah... Não dói em mim mesmo.
-...
- Mas.. E você, Juma, já se esqueceu do Donatário?
- Não...
- E acha certa continuar sustentando um amor pela fantasia?
- Também não.
- Então porque não diz logo que ama o garoto, menina?
- Eu não posso supor o que eu nem sei o que é.
- Você não sabe se o ama?
- Sei sim. Eu amo o Don. Mas não sei o que é esse tal de amor.
- Ah... Sim. Entendi. E... Então, você vai continuar nessa de fantasia até quando?
- Não sei. Não tenho pressa em me abrir. O que eu sei é que você não tem idéia do quanto sofro com isso.
- Poxa.. Já que não consegue se abrir, então por que não o esquece?
- Ah. Porque eu gosto mesmo é de sofrer.

quinta-feira, 11 de setembro de 2008

Quinta-feira

Como quem não quer nada
Arrisco-me no bem-me-quer/mal-me-quer
Ainda que cedo ou tarde.
Não há problemas, nós sempre nos atrasamos mesmo.
Afinal, o que são sete vidas, sete planos
Sete altares, sete minutos?

Tarde é deixar de perder
O ônibus no meio do medo,
No meio da fala desencorajada.

Onde está a sede que antes sentia?
Sede que me fazia beber até suar?
Largada no chafariz central?

Luz anêmica,
Vertigem,
E o estômago pede janta.
Já é noite, meu amigo.
Cadê as palavras? Voando?
Trate, então, de pegá-las.
Logo. Que daqui a pouco
A madrugada estará
Passando pela metamorfose lunar.
Pegue, logo.
Que já é outro dia.



(Sentiu o imperativo?)

sábado, 26 de julho de 2008

Correntezas
à vagar.
Vaga no porta-malas
da cabeça ôca.
esvaziada de tanto
que tentou expelir
as atormentações.
Um sopro uma fuga
uma emigração de pensamentos
lineares e bem analisados
numa íntegra métrica
graficamente traduzidos
insistentemente calculados

depois que o tudo
passou a ser nada
fiquei perdida
no desvario
do meu vazio.
Vida,
gire à desentreter a razão
distraia o meu coração
que sofre de tanto ser pensado.


roda vida, roda
suplico-te pelo menos
meia volta.

quinta-feira, 17 de julho de 2008

... Love, still far

Tanta arte - para quê - tanta fantasia?
Meu amor não quer mais
não quer mais
apoiar-se naqueles fios falsos,
nas lágrimas sem sal e sem sentido
vãs, vãs!
são o que são essas águas
mal choradas e não vividas

não servem para nada
nadam, pois, na minha face
sensível que lhes dá serventia

lubrificam meus olhos
desembaraçam a minha visão
para que nitidamente eu veja
o que existe e o que não.

para que eu saiba
e seja sábia
quando tiver que abandonar
para sempre esse sentimento
angustiante pegajoso inseguro
lastimável , utópico?

quando o amargo do real
cair sobre o mel da fantasia
quando eu tiver medo
e insistir no mito

vou gritar para expulsar
o azedume que me fere
e fazer um chá calmante
pra cessar os ventos ruins
e deitar no calor da calmaria.




quarta-feira, 16 de julho de 2008

Love, so far

Lembro e relembro
Chamo, murmuro um pouco de atenção
Da imagem jamais vista
Mas que se mantem presente em minha memória
Sob letras datilografadas
E em minha agenda de linhas pretas
E letras cinzas nas entrelinhas.
Também numa parte emblemática
De meu corpo turvo
Escondida e sublinhada
Pelas células turgidas de amor

Entre os fios da insegurança
Ele se equilibra :
Esse não-garantido e não-admitido amor.

sexta-feira, 27 de junho de 2008

Porta
Poeta
Portal
Poesia
Poeira
Parnasiana
Métrica desmedida
Alinhando
O corpo desalinhado
Da porta apertada
Metrificada
Da vala ladeada
Da vida.

terça-feira, 17 de junho de 2008


No fim do túnel além da luz
Há uma porta
Bem lá no fundo
Ao acaso
E caso ele se esqueça da chave
Não importa
Ainda tem a luz
Acima do braço direito
Ela brilha enleia aos olhos dele

...Enquanto ele se envolve
Sem perceber, a luz vai perdendo calor
E ele, quanto mais se deixa comprometer-se
Vai absorvendo veemente
A veemência dela

Num único lume
A luz, o homem
Entregam-se no cume da temperatura mais alta

...mas ele regressa

Lembrou-se de onde guardara a chave
A chave!
No bolso frio esquerdo
A mão toca-a: choque térmico!

terça-feira, 20 de maio de 2008

Nada mais que isso.

Uma grama pra deitar
Um aconchego pra acalmar
Um ar fresco pra respirar
Tudo que quero
Num dia quente de domingo

Menos aflição
Mais libertação
Menos agonia
Mais calmaria

Menos chama
De um fogaréu extasiado
Cansado

Mais vida fresca
Ordenada
Menos confusa
Menos astuta
Menos traiçoeira

Quero deitar na fantasia
Sair um pouco da realidade
E viver poesia...

[num papel rosa com perfume, dentro de um envelope branco]

segunda-feira, 19 de maio de 2008

Segunda-feira

Segunda-feira
O sol nasce
Seus olhos se abrem
Nasces tu
Nasce novidade
Nova és tu
De mente sã
Levanta automaticamente
Cambaleante
Como se o mundo
Fora do inconsciente
Fosse incomum

Na vertigem,
Anda até a clareira
Onde alivia
A insônia do outro mundo
O mundo dos sonhos
Do qual não quer acordar.

quinta-feira, 15 de maio de 2008

Quando anularam minha alma

O diálogo foi rápido e capaz de uma só vez me tirar a pouca convicção que tinha quanto a minha existência e ao meu preço vil.
Foi como se sugassem toda a minha vitalidade que se manifesta nas cores e brilho da minha face, fazendo-me ficar anêmica de alma. Levando comigo, no corredor que seguia, a sensatez de inexistência e a fome de voltar a ser não só carne e osso.
Esta fome, ao mesmo tempo em que queria ser preenchida, queria também se afundar e se esmagar para não ser percebida.
A parte displicente e aparente de mim derramava o líquido rejeitado(extamente como me sentia, desprezada) : escretas reduzidas ao gosto suave e salgado, doce e amargo. Expeliam-se e depois se escorriam sobre minha casca até chegar à mesa onde, apoiados os braços, me debruçava. E via, por entre a visão embaçada, as poças reprimidas que se formavam em meio a madeira manchada de números e rabiscos. Abaixei a cabeça buscando me fechar contra todos. No rosto, os rastros secos de lágrimas aborrecidas. Nos olhos fugazes, a busca por respostas tranqüilizantes (e tudo que obtive naquele momento foi a confirmação de uma verdade que eu tentava não pensar). Me senti extraída do meu próprio meio e após soluços, falsas compaixões e hipócritas abraços, absorvi, novamente, o sopro.
[é que nesse mundo somos obrigados a ser feliz.]

O Quarto

Lugar de descanso
De descaso
Fraqueza, cansaço
Por vezes se mostrar mórbido
Banal
Tranqüilo mas não frio

O Quarto é terno
Tenro acolhedor
Acolhe suas dores
Que por algures se perde
Ao entrar no espelho brando
De sua alma - O Quarto

É a personificação do seu eu
O fenótipo das emoções mais profundas
A manifestação em cores formas
Dos devaneios guardados
Dos sonhos nunca seqüestrados

O Quarto é a sua única
E verdadeira liberdade.

terça-feira, 1 de abril de 2008

Eu mudei
Meu quarto mudou
Ventos pretéritos não presenciarei
Tudo se foi e não mais voltou

Eu mudei
E ninguém reparou
De sapatos novos passei
Nenhuma lástima se formou

Hoje com calma eu vou
As lembranças, é claro, transitou
Mas jamais volverei

Eu mudei
Meu mundo mudou
Volúvel eu sou.

sábado, 26 de janeiro de 2008

Desespero.

Tudo penso, nada escrevo. E assim, vejo um alfabeto inteiro se perdendo dentro de mim. Caneta enferrujada. Mão inerte sobre a folha, na espera ociosa e ansiosa de palavras e contextos coerentes ou não, descrever em poesia as cores da vida e dissertar em prosa suas nuances descoloridas. Desboto de humores variantes. Penso. E, enquanto vou sendo devorada por pensamentos, procuro uma fresta para respirar. Desabafar. E , enfim, articular letras. Letras estas que, no momento andam tímidas dentro de mim. Eis aqui o meu desespero. Pois bem! Colocarei tinta infinda na caneta, costurarei letras franzidas, e jantarei uma sopa de letrinhas para que a vida, a arte, nunca estejam completamente mortas.